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Deus e o Diabo na terra do futebol ou a não humanidade de Kaká.

Postado por Marlon Marques. 22 de dezembro de 2010

por Marlon Marques.


















Ricardo Izecson dos Santos Leite é um rapaz evangélico, batizado e convicto de sua crença e das atribuições desta. Ricardo é pagador do dízimo de sua igreja – de acordo com a doutrina da mesma, procura observar os mandamentos e levar uma vida reta e longe dos excessos terrenos. A profissão de Ricardo Izecson é jogador de futebol – nós todos o conhecemos como Kaká. Kaká sempre teve fama de bom moço e de galã, entretanto, a fama de bom moço sempre lhe caiu melhor por conta de sua religião. Através da narrativa de Atos 8:3-1 – os cristãos sofreriam perseguições. E Kaká como cristão também passou a ser refém de sua condição, já que alguns diziam que o futebol é um esporte viril demais para um rapaz religioso. Numa leitura livre, Kaká acabou sendo hostilizado no São Paulo por conta da observância adaptada de Êxodo 20:13, “não matarás” – traduzido na linguagem do futebol como violência e divididas. A torcida achava que Kaká não dividia, tinha medo de se ferir e de ferir os adversários. Ou seja, a religião sempre acabou sendo um pretexto para desqualificarem Kaká. A Europa transformou-o – fisicamente e psicologicamente, apenas seu espírito continuou inalterado, suas crenças e convicções. Kaká tornou-se mais viril, posou até para Armani só de roupas baixas – Kaká percebeu que ainda vivia nesse mundo e que não poderia ficar imune as tentações deste. Entretanto a relação que nós, cidadãos estabelecemos com as pessoas famosas é um tanto doentia. Idealizamos, criamos modelos de perfeição, criamos listas de características de que apreciamos, construímos altares e colocamos essas pessoas e as cultuamos. Um ídolo nunca falha, não tem defeitos, não erra. Essa divinização nos apequena – nos tornamos mínimos perto deles. Isso também traz conseqüências ao ídolo. O ídolo fica numa posição de sempre suprir as expectativas dos fãs, de nunca falhar e de agir de acordo com as regras deles – os fãs. Isso é um espelho reverso de personalidades – o fã reflete o ídolo que é moldado pelo próprio fã. Kaká por sua conduta irretocável sempre foi elogiado pela imprensa e demais companheiros de profissão – por sua atribuída beleza e conduta ganhou um fã-clube – as “kakazetes” – garotas que o seguiam onde fosse, com cartazes, corações e choro. Toda essa badalação e assédio tirou a humanidade de Kaká – que permanecia imaculada inclusive por se casar “puro” com sua escolhida companheira. Essa é a assunção de Kaká, sua beatitude – diferenciando-o de vez do estereótipo dos jogares de futebol – adúlteros, filhos de vários relacionamentos diferentes, bebidas, drogas, baladas, etc. O casamento coroou a condição “santa” de Kaká e fez com que seus fãs, se tornassem seus devotos. O Salmo 37:5 diz: “entrega o teu caminho ao Senhor, confia nele e ele tudo fará” – Deus fez de Kaká o melhor jogador do mundo, lhe deu fortuna material, um filho, títulos, chegando a ser em 2009 considerado uma das 100 pessoas mais influentes do mundo. Kaká realmente é um homem diferente, abençoado, concluíram seus seguidores. Porém um fato abalou a reputação do craque. No jogo contra o Chile pelas oitavas-de-final da Copa do Mundo da África do Sul – após perder um gol, Kaká desferiu um palavrão: – “puta que pariu”. Devido ao alto nível tecnológico, várias câmeras captaram o momento – a imagem correu o mundo. O fato gerou sarcasmo para uns e indignação, surpresa e decepção para outros. – “Onde já se viu um rapaz cristão falar essas coisas, que coisa feia”, comentaram alguns. Os fãs do jogador se dividiram, alguns chegaram à se expressar dizendo que nunca imaginaram que ele fosse capaz de dizer algo do tipo. Isso se dá justamente pela idealização dos fãs e pela prisão que Kaká vivia. Palavrões fazem parte do futebol, assim como empurrões, carrinhos, chutes e pontapés. O futebol é uma guerra simbólica, e em embora seja um jogo materialista, tátil, há muito de simbolismo também. Kaká conhece os palavrões porque já os ouviu muitas vezes, só não têm o hábito de falá-los. E um traço muito peculiar dos brasileiros é o apurado senso de totalidade. Você faz tudo certo durante 364 dias – no último dia do ano você comete um erro, pronto, seu ano foi ruim. Um dia acaba com um ano todo – um erro se sobrepõe a trezentos e sessenta e quatro acertos, e Kaká foi vítima disso. Toda sua reputação fora manchada por conta de um único palavrão – tudo o que fez, todos os seus mandamentos observados, os dízimos pagos, a caridade, a vida casta, tudo isso fora esquecido, Kaká agora tornou-se um de nós, como nós – humano, falho. Veja o paradoxo. A queda de Kaká se assemelha a queda do homem: “então disse o Senhor Deus, eis que o homem se tornou como um de nós, conhecedor do bem e do mal”, Gênesis 3: 22 – ou seja, Kaká precisou falar um palavrão para receber a humanidade que lhe tiraram. Mas que inversão! – os devotos é que se tornaram deuses, dando e tirando a “humanidade” dos homens e tornando-os santos. Kaká cansou-se de desempenhar o papel que lhe atribuíram e jogou sua santidade fora quando falou aquele palavrão. Kaká é expulso de campo, faz faltas e as recebe também – falha, como falhou junto com toda seleção brasileira, faz sexo, vai ao banheiro, fala coisas feias, em suma, é tão humano quanto nós. Mas a cegueira da idolatria faz com que criemos falsos deuses – ferindo de uma só vez outros dois mandamentos: “não terás outros deuses diante de mim”, Gênesis 20:3 – “não farás para ti imagem de escultura [... ], não as adorarás, nem lhes darás culto”, Gênesis 20:4-5. Kaká foi elevado demais pelos seus fãs – que precisaram ir do amor a dor para enxergar que “debaixo do sol”, para citar Eclesiastes, “todos somos iguais”.


















5 comentários

  1. Um elogio não só eleva o ego como também faz crescer a responsabilidade e o peso nas costas de quem o recebe.

    Abraço

     
  2. Anônimo Says:
  3. Muito bom o artigo, acho que foi de grande importância para quem lê. As pessoas não sabem separar o homem de Deus, e quando se decepcionam com alguém que achavam "perfeito" começam a condenar. Muito bem citado Eclesiastes, pois "debaixo do sol", todos somos iguais e tudo isso já aconteceu um dia, afinal nada é novo, e tudo isso é vaidade.

    Mirian Linares

     
  4. Adorei o texto que só textifica o assunto qe abordei no 1° post da coluna transcndência..
    http://cappuccinomagazine.blogspot.com/2010/12/perfeitos.html

     
  5. Talita Lira Says:
  6. Oi Marques gostei do post, parando para refletir é realmente isso que acontece na atualidade, o ser humano faz do homem um Deus, idealizando a "perfeição" nele, onde ele tem que permanecer intacto, sem cometer "eros".
    Beijos, saudades.
    Talita Lira

     
  7. Anônimo Says:
  8. Sem cometer "ERROS"... hsuahsuahs, mas o comentário foi bom xD

     

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